Foi divulgado o vencedor do concurso para revitalizar as passagens subterrâneas do eixão. Um escritório de arquitetos, de São Paulo, foi o escolhido.
Embora tenha insistido em deixar o túnel com esquinas – o maior fator de insegurança das passagens -, a proposta é realmente boa. Fiquei mais impressionado pela articulação com uma futura (?) ciclovia do Eixão. E com a proposta aberta e declarada de não incluir estacionamentos cobertos para automóveis.
[Peraí!! no Termo de Referência do concurso falaram em estacionamentos cobertos para carros nas passagens subterrâneas!! Perderam o senso do ridículo – o vício faz isto com as pessoas…]
[não se pode construir um metro quadrado em Brasília sem pensar nos automóveis???]
Voltando. Ainda bem que a proposta ganhadora descartou essa insensatez. Mas acho que poderiam ter ido além. As passagens subterrâneas tiveram seu traçado original alterado quando construíram as alças laterais que ligam os eixinhos ao comércio. Para dar prioridade ao carro, a via passou bem em cima da antiga saída das passagens e fizeram “esquinas” no túnel para desviar a saída para outro lugar. Esta foto, do Arquivo Público do DF, reproduzida no livro Arquivo Brasília, de Lina Kim e Michael Wesery, mostra qual era o traçado original das passagens subterrâneas:
Aliás, a foto está reproduzida na proposta do 2º colocado, que foi feliz ao mostrar isto, mas infeliz em outros pontos. Paraciclo? O que é paraciclo? Se propõe um acesso linear, por que manter o antigo e as “esquinas”?
Só quem usa todo dia as passagens subterrâneas sabe que a esquina é o ponto de maior insegurança. Uma esquina dentro de um túnel estreito… merece o Prêmio Ignóbil. É comum, muito comum a gente ver cabeças dos malas escondidos. Eles ficam parados na esquina para dar o bote surpresa. Mas também é comum o senso de comunidade. As pessoas notam os bandidos tocaiados e espalham o alerta. Nesta hora, o fluxo de pedestres passando por cima das vias é bem maior. Por vezes fica um assaltante na saída da passagem, boca do túnel, monitorando, e outro esquinado dentro da passagem.
Uma proposta recebeu menção honrosa ao propor a passagem sob(re) o eixão. Isto mesmo, uma grande faixa de pedestres, com semáforos e tudo mais! É a cidade que queremos, gente não é tatu pra viver em buracos, mas Brasília ainda não está preparada para isto – tanto que a proposta não ganhou.
[mas aqui é preciso fazer outro parêntesis: faixa de pedestres com semáforo mantém a prioridade do automóvel; além disto, existe faixa de pedestre com semáforo nas quadras comerciais, mas a maioria das botoeiras está quebrada, não adianta acionar para o sinal fechar! Em outros semáforos, o tempo de abertura é mínimo e o tempo de espera do pedestre se estende por mais de 2 minutos :-(][ou seja, mesmo semáforo não resolve, se não houver manutenção e – sobretudo – prioridade ao pedestre, sempre]
Esta proposta foi muito avançada ao propor a faixa sobre o eixão, com semáforos, mas regrediu muito ao manter o estacionamento coberto para automóveis e ao propor ciclovia no canteiro central dos eixinhos. Como é que o ciclista faz para chegar e sair de uma ciclovia no meio de duas pistas lotadas de carro?
Impressionante como o governo e as cabeças pensantes dão voltas e mais voltas para deixar tudo como está. Duplipensar.
A solução para pedestres e biciclistas é simples: deixá-los sempre em primeiro lugar, em primeiro plano. Pense no simbolismo dos planos: o pedestre lá no fundo, escória escondida. Subterrâneas, submissão, subjugados. E os automóveis no alto, ao plano das grandes construções arquitetônicas, brilhando sob o céu de Brasília! Revitalizar uma solução urbanística que enterra pedestres para priorizar o automóvel é continuar pensando dentro da mesma bolha, é reforçar décadas de políticas urbanas sobre rodas.
“Todo poder ao pedestre, restrições ao automóvel” – nem mesmo um governo “popular” consegue levantar esta bandeira, pffffffff…….
Um dia, estava passando pela passagem da 103-203 sul e vi um homem catando papéis e varrendo o chão. Não sei o nome, mas vamos chamá-lo de Garibaldo, o Gari. Gari não só fazia o serviço dele, mas tentava consertar uma lixeira quebrada, sem sucesso. Além de estar com o suporte quebrado, a lixeira tinha um furo no fundo. Mas Gari não desistiu, deu uma ajeitada aqui e ali para deixar a lixeira mais em pé, colocou um saco de lixo para a sujeira não passar pelo buraco.
As cidades precisam disto. Menos niemeyers e mais garis. As passagens subterrâneas sob o eixão, como estão hoje, são uma aberração. Mas estão ali. Se pelo menos fossem limpas várias vezes ao dia, tivessem iluminação, fossem policiadas, resolveria o problema hoje, agora, sem precisar obras faraônicas e vaidades arquitetônicas.
Brasília está cheia de “espaços de convivência”, de lugares – vazios, abandonados, vandalizados. Pode-se pensar em construir, inovar, mudar, mas por que não conservar antes o que já existe?
Por falar em concurso de revitalização, o que aconteceu com o projeto de revitalização da W3? Em 2002 teve concurso nacional, boas propostas e tudo mais. Ops, já lá se vão 10 anos e nada ainda!? O projeto ainda está em análise nas entranhas do GDF.
[contudo, em menos de 4 anos vapt-vupt implodiram um circo um estádio, estão gastando milhões para erguer outro circo estádio, um elefante branco que vai sobrar para um campeonato de 3ª divisão,
e o projeto da W3 tem 10 anos e ainda está em análise e ainda falam que a política de mobilidade é prioridade?][peraí que vou ali vomitar!]
Ah, entendi. Quando for 2022, esta proposta de revitalização das passagens subterrâneas, que ganhou o concurso agora, ainda estará em análise.
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